Canela,

27 de abril de 2024

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Canela registrou 20 crimes sexuais contra crianças e adolescentes em 2022

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Registros subiram após a pandemia de Covid-19, o que indica que houve subnotificação nos últimos dois anos

Filipe Rocha (redacao@portaldafolha.com.br) e Francisco Rocha (francisco@folhadecanela.com.br)

A reportagem da Folha tem noticiado, semanalmente, casos de crimes sexuais contra crianças e adolescentes, tanto em Canela quanto em Gramado, com base nas ações da Brigada Militar e Polícia Civil

Chamou a atenção da equipe jornalística que as ocorrências vem sendo registradas em número maior que em 2020 e 2021. Um crime grave e cruel, que deixa cicatrizes para o resto da vida e que, segundo dados da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, em apenas 30% dos casos há evidências físicas, dificultando a responsabilização dos autores.

A vítima carrega esse “segredo” por longo tempo, sofrendo de forma reiterada e silenciosa. Os efeitos são devastadores: medo, mudanças comportamentais, baixa autoestima e dificuldades de estabelecer vínculos afetivos são alguns deles.

O abuso e a exploração sexual contra crianças e adolescentes, geralmente, são praticados por pessoas queridas, da confiança da vítima, ou por conhecidos, o que torna o problema ainda mais complexo e velado. Assim, a grande maioria dos casos nem chega a ser denunciado ou leva anos até que seja desvendado.

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Segundo os dados da Polícia Civil de Canela, apenas nos primeiros seis meses de 2022, foram 20 casos registrados. Segundo o delegado Vladimir Medeiros, estes números também chamaram a atenção dos agentes da Delegacia.

Este tipo de crime tem alto índice de subnotificação”, disse Medeiros. “Difícil de saber, com mais precisão, se é aumento de casos, se é aumento de registros ou se é ambos. Diferente, por exemplo, de homicídio, um exemplo fácil, mas que ilustra o raciocínio: existem estudos que indicam uma percentagem média de subnotificação de 2/3 (66%) a 4/5 (80%). Ou seja, de cada 10 estupros de vulnerável que ocorrem, são registradas ocorrências em apenas 2 ou 3, na média e isso é um desastre”, afirmou o delegado.

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Na tabela está registrada a série histórica dos crimes sexuais contra crianças e adolescentes, nos últimos 10 anos

Fica evidente que há uma crescente nos números ano a ano e uma queda brusca em 2019 e 2020, o que, segundo a enfermeira Magali Dell Valle Cavinato, do CREAS – Centro de Referência de Assistência Social de Canela, a pandemia dificultou a notificação desses casos, devido à proximidade dos abusadores, medo das consequências que pudessem acontecer caso fosse denunciados. “Canela era ‘um município silencioso’ em relação à situação, então o CREAS começou a buscar informações com o Conselho Tutelar, Hospital de Canela e Delegacia da Mulher, para obter um registro mais completo do panorama”, disse a enfermeira, que acredita que grande parte das violências ocorrem por abandono de incapaz e muitas vezes o infrator está sob influência de álcool ou entorpecentes.

Já o delegado Vladimir entende que, durante a pandemia, as crianças deixaram de circular em ambientes em que se sentiam mais seguras para denunciar, como a escola, casas de outros parentes ou amigos. “Os crimes certamente continuaram ocorrendo, mas os registros caíram. Bem possivelmente, durante a pandemia, até aumentaram, pois todos ficavam em casa o dia todo e os principais abusadores são pessoas do relacionamento das crianças, como familiares, vizinhos e amigos da família”.

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Caso identificado pelo Proerd

Um dos casos que mais chocou a comunidade canelense aconteceu em abril deste ano, quando uma menina procurou o soldado Marcos, da BM Canela, durante o Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência, relatando uma situação de assédio sexual no âmbito familiar.

O padrasto, segundo os relatos, teria abusado da enteada e de outra menina da família, nas ocasiões em que estava em casa com as crianças e a mãe estava trabalhando.

Após a denúncia, o suspeito foi preso preventivamente e segue em privação de liberdade no presídio de Canela, já havendo denúncia ao Judiciário, onde ele é réu por dois estupros de vulneráveis.

Casal participava do abuso

Em março deste ano, a Polícia Civil de Gramado prendeu um casal, suspeito de abusar sexualmente de duas adolescentes, com 12 e 13 anos de idade. Conforme as investigações, os abusos ocorreram entre o final do ano passado e o início deste ano, na residência dos investigados. As vítimas possuem parentesco com os suspeitos, sendo sobrinha e prima da investigada.

As vítimas frequentavam a casa para auxiliar a cuidar dos filhos da suspeita e neste ambiente ocorreram os abusos.

Menina de 12 anos foi estuprada por mais de um mês pelo padrasto

Recentemente, na última sexta (05), a Brigada Militar de Canela foi acionada para atender ocorrência de estupro de vulnerável, na qual a vítima de 12 anos relatou ter sido abusada por seu padrasto, na parte da tarde.

Conforme a comunicante, sua filha, que é amiga da vítima, lhe mostrou um vídeo recebido da própria vítima através do WhatsApp, no qual o seu padrasto introduzia os dedos nas partes intimas da adolescente.

A vítima informou que já havia sido estuprada em outras ocasiões por seu padrasto, de 52 anos, fato que ocorria diariamente há mais de um mês, sempre quando sua mãe saia para trabalhar.

Em todos os casos, os abusadores foram presos, mas as cicatrizes continuaram.

O problema é de todos. Denuncie!

Não é por nada que o termo usado para este tipo de crime é estupro de vulnerável, ou de incapaz. Nestes casos, as crianças ou adolescentes não têm como se defender e o problema acaba sendo de toda a sociedade, de todos nós.

Por certo um trabalho de fortalecimento da rede de proteção, envolvendo todos os órgãos que atuam neste tipo de crime, desde a polícia, o conselho tutelar e os órgãos de assistência, deveria ser prioridade nas políticas públicas, o que, infelizmente, não é a realidade da grande maioria dos municípios brasileiros, situação também de Canela, com poucos profissionais destacados para este enfrentamento.

Se não há como identificar o agressor com antecedência, ao menos nestes casos a punição tem sido exemplar e a maneira de se buscar frear este tipo de abuso é notificar as autoridades competentes dos casos suspeitos de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes. 

Canais de comunicação e denúncia

Em Canela, as denúncias podem ser feitas diretamente à Delegacia de Polícia Civil, que conta com um cartório especializado no atendimento a vulneráveis. O telefone é o (54) 3282-1212 e e o WhatsApp  (54) 99614-4216.

Órgãos como Brigada Militar (190) e Conselho Tutelar podem ser acionados. Existe ainda o Disque 100, específico para estes casos. Em todas as situações, a denúncia pode ser anônima.