Canela,

28 de abril de 2024

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Justiça dá 120 dias para que Corsan e Prefeitura de Canela coloquem tratamento de esgoto em funcionamento

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Rede pluvial chegando ao lago com a obra da ETE ao fundo, sendo a foto extraída do relatório de acompanhamento da Corsan - Foto: Reprodução

Prefeitura tranca aprovação de projetos e exige sistema de fossa, inviável para o local, que conta com estação de tratamento, que está inoperante por incompetência do Poder Público

“Os fatos narrados são graves, seriam cômicos caso não houvesse dinheiro público envolvido. O que se denota é uma malversação dos recursos públicos, um verdadeiro desrespeito com os contribuintes, com a comunidade canelense em geral”, diz a Juíza Simone Chalela, titular da 2ª Vara da Comarca de Canela, ao proferir decisão liminar exigindo que Prefeitura de Canela e Corsan trabalhem para resolver casos graves com relação ao esgoto cloacal em Canela.

A decisão atende Ação Civil Pública, movida pelo Ministério Público, assinada pelo promotor de Justiça Max Guazzelli, relatando uma série de irregularidades e desrespeitos com a comunidade, cometidos pela Prefeitura e pela Corsan.

Moradores não tem projetos aprovados pela Prefeitura, por problema causado por ela mesmo

O caso mais curioso analisado pelo MP é o da ETE Chacrão, a qual atenderia o bairro do mesmo nome, o Aracy Corrêa, o Loteamento Renascer, o loteamento Mirante do Vale e o condomínio residencial Sequoias, possibilitando o atendimento de 450 economias. As estações antigas e ineficientes foram transformadas em estações de bombeamento.

Os empreendedores responsáveis pelo Mirante do Vale, foram chamados pela Secretaria de Meio Ambiente a efetivar, a título de “contrapartida”, pagamentos diretamente à empresa Arcamar, a qual estava construindo o sistema de saneamento através de inexigibilidade de licitação por parte da Prefeitura.

Tal cota de participação seria calculada com base no número de lotes, sem termo de parceria público-privada e o direcionamento de valores de empreendedores para a Arcamar, o que, sem o devido e necessário controle público, tornava os empreendedores reféns da Arcamar.

Com o sistema da nova ETE Chacrão aparentemente concluído, o Loteamento Mirante do Vale recebeu Licença de Operação, momento em que os compradores dos terrenos iniciaram as aprovações dos projetos e edificação de suas residências.

Porém, os projetos em andamento não estão recebendo aprovação, pois o sistema Chacrão não está operante.  O Ministério Público ouviu vários adquirentes dos lotes do Mirante do Vale e a situação é desesperadora para todos: pessoas simples que adquiriram terrenos de forma parcelada e que têm seus projetos pendentes de aprovação em razão da falta de operação do sistema de esgotamento do Chacrão. Informaram que estão vivendo de aluguel e pagando o elevadíssimo valor médio de R$ 6 mil de IPTU por lote e que, se tivessem suas casas construídas, o IPTU cairia para uma média de R$ 1 mil.

Os proprietários de terrenos no loteamento disseram que os lotes estão com as esperas prontas para as conexões à rede cloacal, mas que a Prefeitura agora está solicitando fossas e sumidouros, sistema que o próprio Município de Canela rechaça, pois inviável.

“De fato, não há como infiltrar esgoto em rocha” diz o Ministério Público.

Com o sistema inoperante, as estações tornam-se meras caixas de passagem, lançando esgoto em natura no meio ambiente, em especial em afluentes do Arroio da Casca, que há anos segue sendo poluído pela falta de ação da Prefeitura de Canela e da Corsan.

Vale lembrar que diversos procedimentos criminais sobre este caso já tramitaram e ainda tramitam na Justiça, em especial os referentes às 9ª e 10ª fases da Operação Cáritas, que investiga corrupção na Secretaria de Meio Ambiente de Canela.

Estações seguem abandonadas, sofrendo com furtos e vandalismo
Foto: Filipe Rocha

Estações de tratamento não possuem condições de serem colocadas em funcionamento

Ainda, segundo o Ministério Público, outras estações de tratamento de esgoto não possuem condições de funcionar, nem mesmo com boa vontade.

A ETE Miná não possui recurso hídrico para o lançamento de seus efluentes, sendo que o Plano de Trabalho assinalava que o efluente ia ser despejado diretamente no esgotamento pluvial da cidade.

A ETE Lago possui uma concepção inusitada: a proposta redigida que se colete água da rede pluvial (do lago) para a ETE e, após um tratamento, joga-se de novo na rede pluvial (no lago). “Seria anedótico se não tivessem recursos públicos envolvidos”, diz o MP.

A ETE Maredial se encontra supostamente edificada em área privada, o que merece ser apurado.

No caso das ETEs Miná, Lago e Maredial, os bairro ao seu entorno não possuem rede coletora, ou seja, não há esgoto chegando nas estações para serem tratadas.

Uma quinta ETE, que seria destinada ao bairro São Luiz, não foi montada. Curiosamente, o bairro em questão possui rede de esgoto cloacal e poderia, assim como a ETE Chacrão, estar em funcionamento.

Despejo de esgotos cloacais do loteamento Renascer, formando uma autêntica lagoa de esgotos. No círculo vermelho, a tubulação descartando o esgoto in natura – Foto: Reprodução

Convênio é arremedo jurídico

Outro fato tratado pelo Ministério Público é o convênio assinado entre Prefeitura e Corsan. Como se sabe, a Corsan tem a exclusividade para serviços de esgoto sanitário em Canela, através de contrato com a Prefeitura.

“Assim, no saneamento, ao criarem o monstro de Frankenstein, o Município de Canela e a Corsan abriram uma caixa de Pandora para toda uma sorte de irregularidades, com oportunidades a agentes públicos e associados para a prática, em tese, de uma série de desvios de recursos públicos, com a elaboração de procedimentos supostamente ilegais. Em suma, na confusão criada, temos recursos públicos desperdiçados, empreendedores, na prática, achacados, pessoas simples que não conseguem edificar suas casas e que são pesadamente tributadas pelo Município de Canela”, diz o MP

Liminar dá prazo e estabelece multa

Numa situação classificada como surreal, pela sentença da Juíza Simone Chalela, o Judiciário canelense, via decisão liminar, determina ao Município de Canela que, no prazo máximo de 120 dias, execute as instalações e ligações necessárias à operação do SES do Loteamento Renascer, compreendendo a rede coletora e a ETE Chacrão, dando início à operação do sistema.

Além disso, a Prefeitura deve deixar, imediatamente, de exigir sistema de fossa, filtro e sumidouro para projetos localizados em locais que tenham acesso à redes cloacais.

Já a Corsan tem 30 dias para apresentar relatório técnico completo da viabilidade das demais Estações de Tratamento, caso negativo, apresente soluções para os problemas apontados.

Caso descumpram os prazos, a multa é de R$ 5 mil por dia. Da decisão, cabe recurso.