O abandono de uma criança com necessidades especiais e a tentativa de suicídio de um homem em busca de tratamento médico. Esses episódios, que revelam a face mais cruel da migração urbana, exigem uma reflexão profunda sobre os desafios enfrentados por nossa cidade. Como tratar estes casos com a dignidade que eles merecem?
Dois fatos semelhantes, um em Canela e outro em Três Coroas. Um deles ganhou destaque nacional, o caso do homem que abandonou o filho de três anos, portador de necessidades especiais, em um ônibus, alegando não ter condições de cuidá-lo e de que iria buscar tratamento para a sua dependência química.
O outro, que não havia sido divulgado até a publicação desta coluna, aconteceu segunda (21), na Secretaria de Assistência Social de Canela, quando um pai de família se pendurou em uma árvore, tentando o suicídio, após receber uma negativa de seu pedido.
Segundo informações colhidas pela Folha, ele teria vindo de um município do Estado do Rio de Janeiro, a convite de uma família canelense, para trabalhar aqui e buscar uma cirurgia de reconstituição intestinal, que não era oferecida no seu estado.
Após sete meses, foi dispensado, teve que sair do local onde morava e ficou sem o tratamento para a sua doença. Ao ser informado pela Assistência Social de Canela que o melhor caminho seria retornar para a sua cidade, com o Município custeando as passagens, entrou em desespero e se enforcou na parte externa da secretaria, sob o olhar do filho menor e dos servidores.
Felizmente, o serviço de urgência foi chamado e o homem socorrido.
Em ambos os casos, todos passam bem. O menino de Três Coroas, após atendimento da rede de proteção de lá, foi encaminhado aos avós.
A família de Canela, recebeu moradia no hotel que abriga vítimas dos eventos climáticos. O pai está sendo atendido no CAPS, após a tentativa de suicídio e a rede de saúde avalia o seu caso clínico.
Mas, o que estas tristes histórias têm em comum? Quem resolveu os problemas e está arcando com os custos são os municípios para os quais estas pessoas resolveram ir buscar tratamento ou melhores condições.
A migração urbana é um fenômeno global que, nas últimas décadas, tem se intensificado em diversas regiões do mundo. Em cidades como Canela, a chegada de novos moradores em busca de melhores condições de vida e oportunidades tem gerado desafios complexos para a gestão pública e a sociedade como um todo.
A atração de Canela por seus serviços de saúde, educação e oportunidades de trabalho tem gerado um fluxo migratório significativo. No entanto, a falta de planejamento e de recursos adequados para atender a essa demanda crescente tem resultado em situações como as descritas acima.
Não se iluda, nós moradores acreditamos que os serviços públicos oferecidos são ruins ou insuficientes, mas são muito melhores que na maioria dos municípios brasileiros. Nossa cidade se destaca por oferecer serviços essenciais que não são encontrados em outras regiões. Essa realidade, aliada à oferta de emprego no turismo, gera esse fluxo migratório, com um custo social elevado para atender a uma população cada vez maior e com necessidades diversas.
Os desafios da gestão pública
As novas administrações municipais da região e de Canela terão que enfrentar o desafio de encontrar soluções para os problemas gerados pela migração urbana. A criação de políticas públicas eficazes para a assistência social, a saúde e a educação será fundamental para garantir a qualidade de vida da população e promover a inclusão social.
A existência de cinturões de pobreza e de áreas invadidas são sinais claros da necessidade de investimentos em infraestrutura, urbanização e geração de emprego e renda. Além disso, é preciso fortalecer a rede de proteção social para atender às famílias em situação de vulnerabilidade.
Mas, antes de tudo, os municípios da Região terão que encontrar solução para conter a migração que acaba nas áreas invadidas e zonas de risco. O desafio é gigante.
É preciso encontrar um equilíbrio entre a necessidade de acolher os novos moradores e a capacidade de oferecer serviços e infraestrutura adequados.
Os dois casos relatados aqui são tristes, estão sendo trabalhados, mas exigiram um esforço enorme dos municípios, mas, que, apesar de bem encaminhados, não passam de “enxugar gelo” no complexo caso da migração que recebemos. É hora de a sociedade e os governantes enfrentarem essa crise de frente, antes que histórias como essas se tornem ainda mais comuns.
Uma coluna só é pouco para debater este tema, prometo voltar ao assunto.