Canela,

28 de março de 2024

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Quebrando o silêncio! O perigo das redes sociais…

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O suicídio de duas meninas de 14 e 18 anos, em outubro de 2014, deixou um alerta para a população da Região das Hortênsias. Na época, 17 famílias de vários níveis sociais e com ligações religiosas foram atendidas pelo município através de reuniões. Atualmente, o Centro de Atendimento Psicossocial (CAPS) de Canela ainda acompanha três meninas envolvidas no caso e o Inquérito Policial está em fase final de instrução e será remetido ao Poder Judiciário em no máximo um mês.
De acordo com o Delegado de Polícia de Gramado Gustavo Celiberto Barcellos, responsável pelo caso, por meio de investigação suspeitos foram identificados por instigar os suicídios e existem depoimentos que os incriminam. Além disso, buscas foram feitas nas casas e a perícia nos equipamentos não foi conclusiva, restando apenas a prova testemunhal.
Barcellos esclarece que todos os casos de suicídio são investigados com instauração de Inquérito Policial e que suicídio não é considerado um crime, mas a participação de outra pessoa em um, sim. “A investigação tem por objetivo esclarecer todas as circunstâncias do fato, se houve mesmo suicídio (ou homicídio), motivação e, em sendo suicídio, se ocorreu participação de terceiros no ato da vítima”, explica ele.
Mas, o que traz este assunto de volta é a importância em quebrar o silêncio e alertar os pais quanto ao crescente número de jovens com ideações suicidas. As psicólogas Mônica Boeira e Janine Palodetti falam que deixar o preconceito de lado e falar sobre o assunto é uma forma de desmistificá-lo. “O diálogo trabalha como esclarecedor e faz com que os jovens assumam uma postura crítica sobre isso”, opina Janine. Para Mônica, a maioria das pessoas que se matam já fizeram várias tentativas. “Se tem a ideia errada de que falar sobre isso irá piorar a situação. Se a gente acaba não falando, as pessoas acham que realmente não tem solução, quando na verdade podemos fazer algo”, diz.
Conforme publicação do Mapa da Violência, que se baseia em dados coletados pelo Ministério da Saúde, as faixas em que as taxas de suicídio mais cresceram no Brasil, entre 2002 e 2012, foram as dos 10 aos 14 anos (40%) e dos 15 aos 19 anos (33,5%). No Rio Grande do Sul, as estatísticas da Secretaria da Saúde, apontam 60 suicídios nesse grupo em 2013, o maior número desde 2009, sendo que a cada 24 horas, três pessoas cometem suicídio. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) revelam que o suicídio é a terceira causa de mortes no mundo na faixa etária entre 15 e 35 anos, com cerca de um milhão de vítimas por ano.
Em Canela, conforme dados fornecidos pela psicóloga e coordenadora do CAPS de Canela Janine Palodetti, cerca de 2 pessoas são atendidas por semana, a maioria com idade entre 14 e 16 anos, com ideações suicidas ou que tentaram tirar a própria vida. O número é alarmante se pensado que ao longo de um ano, apenas, são aproximadamente 96 pessoas atendidas nestas condições. Somente neste ano, ocorreram 25 internações, contando todas as faixas etárias, por tentativa de suicídio ou risco à vida no Hospital de Caridade de Canela (HCC).

 

Sinais

quebrando-3Estudos comprovam um maior número de casos de depressão no inverno, pois nesta época do ano a substância responsável pela ativação da felicidade no cérebro, a serotonina, que é ativada pelo sol, aparece em menos quantidade do que nas outras estações. Segundo a psicóloga Mônica Boeira, que atende os usuários do Centro de Referência Especializado em Assistência Social (Creas), as pessoas que cometem suicídio costumam ter algum histórico de transtorno psiquiátrico ou depressão, mas que isto não é uma regra.
A psicóloga Janine Palodetti enfatiza que na maioria dos casos que envolvem adolescentes há uma vinculação com relações amorosas frustradas ou alguma confusão de identidade sexual, bem como algumas doenças psíquicas de base como a depressão, a esquizofrenia ou transtornos de humor. “É típico desta idade passar por um afastamento dos pais para conseguir definir nossa identidade. Com isso, nos aproximamos de outro grupo que corresponda aos nossos ideais e para fazer parte dele precisamos ser aceitos”, esclarece.
A adolescência é a fase de mudança da infância para a vida adulta. Ao contrário do que a maioria das pessoas pensa, é muito fácil entrar em depressão nesta etapa, pois os jovens ainda estão em busca de sua identidade. Muitos deles se sentem perdidos diante da necessidade de fazer escolhas ou mesmo pela autocobrança. “As próprias cobranças sociais são muito difíceis. Eles têm que ter tal celular, tal coisa, se não eles não são aceitos naquele determinado grupo de pessoas. Eles acham que não vão suportar aquilo”, explica Mônica.
Alguns dos sinais da depressão podem ser notados quando os jovens se afastam de atividades que costumavam fazer ou de amigos, indicam pensamentos negativos, baixa autoestima, dormem muito ou tem insônia, demonstram mudanças no apetite ou irritabilidade além do normal. Outros fatores que podem levar a ideações suicidas são a violência na família, o abuso sexual, o vazamento de imagens / vídeos dos adolescentes com conteúdo sexual e até mesmo o bullying sofrido na escola.

Redes sociais

quebrando-4Principalmente por conta do trabalho, os pais não conseguem falar e se relacionar com os filhos da forma como gostariam. Sendo assim, eles acabam ficando muito mais tempo nas redes sociais e com os amigos do que com os próprios pais.
No meio digital eles buscam figuras para identificação, assim como ideias sobre a vida e a morte. Da mesma forma que elas podem servir como fonte de informação, elas podem facilitar planos, ritos, etapas ou mesmo a comunicação dos jovens com grupos suicidas, caso o adolescente já tenha tido ideações de morte.
Nos casos de 2014, por exemplo, a perícia não logrou trazer evidências de que os suicídios tenham sido combinados pelas redes sociais, embora existam depoimentos nesse sentido, conforme aponta o Delegado Barcellos.

Onde buscar ajuda?

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Atualmente, Canela não tem nenhum trabalho específico para prevenção destes casos, as ações realizadas são mais paliativas do que preventivas. Todos os atendimentos são feitos pelo CAPS. Se a ideação suicida é identificada, as profissionais do Centro avaliam o caso e se necessário, a pessoa é internada para conter a crise e para proteger a vida do paciente. Tanto a pessoa quanto a família são acompanhados. Janine alerta que sempre é importante tentar primeiro estabelecer um fortalecimento da atenção familiar, a fim de que o adolescente se sinta amparado.
A nível Estadual, é possível contatar o Centro de Valorização da Vida (CVV) pelo telefone 188, o qual oferece ligações gratuitas, inclusive por celular, pelo chat ou chamada de voz online acessando cvv.org.br.

O que os pais devem fazer?

Mônica afirma que às vezes a família acaba piorando a situação dizendo que os jovens não tem motivo para tirarem a própria vida ou mesmo para se sentirem depressivos. “As pessoas têm muita dificuldade em buscar ajuda. Os pais devem demonstrar atenção, buscar uma aproximação com os filhos através de um diálogo mais frequente, acompanhar o dia a dia, bem como serem mais participativos na vida dos filhos”. Para Janine os pais também devem controlar um pouco mais os filhos, mas ao mesmo tempo tentar criar um vínculo maior com eles. “É importante saber quem são os filhos, buscar saber quais são suas ideias, o que eles gostam e o que fazem”, diz ela.