Canela,

28 de março de 2024

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De Prosa e Verso por Fabiano Hanel: Pingos

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Neste aparte cultural, relembro os versos do poeta carazinhense, Guilherme Schultz Filho, nascido em 2 de abril de 1911, foi advogado, membro da Academia Rio-grandense de Letras, vice presidente da OAB do Rio Grande do Sul e também fez parte da Estância da poesia Crioula. Contribuiu para o Movimento Tradicionalista Gaúcho com as suas poesias e como presidente nos anos de 1973 e 1974, faleceu em Porto Alegre em 28 de abril de 1976. Publicou diversos livros de poesia sendo eles: Antologia da Estância da Poesia Crioula – 1970, Guilherme Schultz Filho e outros compiladores Osório, o legendário – 1970, Biografia Gesta de um clarim – 1975, Poesia Crioula Rodeio das Águas- 1976, Poesia Crioula Galponeiras – 1980, Poesia Crioula Símbolos Crioulos – Poesia Crioula. Entre as suas poesias mais conhecidas encontramos “Pingos” e “Gesta de um Clarim”, esta última vencedora de um concurso realizado pela Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul sobre a temática da Guerra Farroupilha.

Pingos

Guilherme Schultz Filho

Em cada ronda da vida
eu tive um pingo de lei.
Montado, sou como um rei,
pelo garbo e o entono.
Cavalo pra mim é um trono:
e neste trono me criei.

De piazito já encilhava
um peticinho faceiro,
que era cria de um overo
e de uma egüinha bragada:
era da cor da alvorada
o meu petiço luzeiro!

Rosado como as manhãs,
do pêlo da própria infância,
mascando o freio com ânsia,
parece que até sorria…
Chamava-se “Fantasia”
e era a flor daquela estância.

Já mocito, o meu cavalo
era um ruano, ouro nas crinas,
festejado pelas chinas
que o chamavam – “Sedutor”.
Formava um jogo de cor
sob os reflexos da aurora

Co’os cabrestilhos da espora
e os flecos do tirador.

Naqueles tempos de quebra,
nos bolichos, ao domingo,
sempre floreando meu pingo
todos me viram pachola
com o laço a bate-cola
e virando balcão de gringo.

O meu cavalo de guerra
chamava-se “Liberdade”!
Chomico! Ouanta saudade
me alvorota o coração!
Era um mouro fanfarrão,
crioulo da própria marca
e eu ia como um monarca
na testa de um esquadrão.

Em uma carga das feias
(como aquela do Seival)
o mesmo que um temporal
rolamos por um lançante
e até o próprio comandante
ficou olhando o meu bagual.

Homem feito e responsável,
o meu flete era um tostado,
tranco macio, bem domado,
êta pingo macanudo!
desses que “servem pra tudo”,
segundo um velho ditado.

Mui amestrado na lida,
um andar de contra-dança;
de freio, era uma balança,
campeiro, solto de patas…
Gaúcho, mas sem bravatas,
e o batizei de “Confiança”

O cavalo que encilho
nesta quadra da existência,
dei-lhe o nome de “Experiência”.
É um picaço de bom trote
e levando por diante o lote
rumbeio à Eterna Querência.

E, assim, vou descambando,
ao tranco e sem escarcéu,
sempre tapeado o chapéu
por orgulho de gaúcho,
e se Deus me permite o luxo
entro a cavalo no céu!